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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Ser um Gay Normal...

ATENÇÃO: Esse é um post de reflexão pessoal. Como minhas ideias normalmente não entram em conformidade com a realidade, perdoem qualquer erro de referencia ou de conceito seja lá do que for


Na ultima sexta eu fui a uma confraternização de final de perído, com os meus amigos de turma. Lá, nos encontramos com uma amiga que trancou a facul, pois queria tentar outro curso. Vou chama-la de Amiga Fofinha. Realmente, ela é uma fofa. O Clima geral era de descontração, como deveria ser. O problema é que em um momento da conversa, essa amiga fofinha fez um comentário que me fez refletir um pouco.

Amiga Fofinha, com a câmera na mão: Ahh Júlio, deixa eu te mostrar um amigo meu que também é gay...
Eu: Humm, deixa eu ver...

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Eu: Realmente ele é bonito (era mesmo, gente).
Amiga Fofinha: Eu até queria te apresentar, mas ele já ta namorando.
Eu: Poxa, que pena...
Amiga Fofinha: Pior é que o namorado dele é muito afetado...
Eu: É mesmo?
Amiga Fofinha: Pois é, eu acho. Ele não é normal igual a você, ele é muito afetado, sabe como é, né? Eu acho isso muito estranho. Não tem necessidade disso, né?
Eu: É né... (a contragosto)
Amiga Fofinha: Se meu amigo terminar com ele, eu te apresento meu amigo... (risos)
Eu: (risos)

Esses dias eu li um post no blog do Foxx, que aliás, foi bastante esclarecedor em vários sentidos. Há um tempo atrás, a luta contra o preconceito era apenas uma questão de bem-estar, como eu não me importava muito com o meu próprio bem estar, e apesar de me importar com o dos outros, nunca me liguei que minha participação poderia fazer diferença, eu acabei deixando essa questão de heterossexismo (não sei se é o termo certo, não queria usar homofobia aqui) meio de lado. Depois de ler o post do Foxx, e outros posts não apenas do Foxx, mas de outros blogayros brilhantes, minha visão sobre o assunto passou por várias modificações.

No início de tudo, eu era um cara muito preconceituoso com os caras mais afeminados. Tinha uma visão até um tanto facista com relação a isso. Pra mim, eles só queriam aparecer, se mostrar e chocar a sociedade. Na minha cabeça, isso era uma exposição desnecessária. Eu nunca senti necessidade de adquirir características femininas, como seios, ou usar batom, ou até mesmo assumir um tom de voz mais feminino. E eu interpretava isso como regra geral, logo, ninguém precisaria disso, e se agisse dessa maneira era porque queria chamar atenção. Vocês não tem ideia de como eu tenho vergonha de ter um dia pensado assim.

Eu fui amadurecendo, fui tendo mais contato com os outros gays. Conheci gays de todos os tipos, afeminados ou não, travestis... Algum fundamento tinha que ter para explicar tanta gente diferente dentro de um mesmo grupo. Não fazia parte da minha lógica interpretar um grupo por um comportamente padrão, mas eu acho que sempre tive tendencia a pensar assim meio que por instinto, ou seria mesmo o tal do condicionamento social. Nada que seja impossível de ser eliminado.

Eu li muita coisa, tentando achar explicações. Depois de um tempo, eu caí em mim. Será que eles fazem isso apenas para chamar atenção mesmo? E tentei fazer uma coisa que nunca antes tinha pensado em fazer: me colocar no lugar deles. Foi só isso. Se não tem lógica se tornar gay, também não tem lógica querer ser afeminado. Quem escolhe ser um chamaris de homofóbicos preconceituosos, quem escolhe sofrer as diversas modalidades do mesmo preconceito em todos os ambientes pelos quais passa? Se um homem é afeminado, é porque ele nasceu assim, com essa característica. Para arrematar esse raciocinio, eu li alguns artigos, supostamente de cunho científico, que afirmavam exatamente esse raciocínio.

Com o tempo, eu fui vendo isso de maneira muito mais natural, de forma que hoje, chamar um afeminado ou afetado de estranho ou anormal passa a ser tão absurdo quanto dizer que um negro é menos capaz de passar em um vestibular que um branco. Acabei até simpatizando demais com os afeminados, hoje eu até me atraio pelo tipo, o que antes o preconceito não me deixava (fala sério, eu acho super charmoso quando um cara chega pra mim com aquela voz afeminadamente entonada... xD). Me sinto mais maduro com essa visão, como se eu tivesse dado um passo a frente no caminho para ser uma pessoa cada vez mais evoluida, que não julga as outras pela capa.

Mas depois de tudo isso, ainda assim eu ainda não me identificava nem fazia questão de me engajar na nossa causa, não sei se por preguiça, se por não compreender ao certo a dimensão disso tudo, ou uma mistura dos dois. Só que outra coisa que o Foxx conseguiu fazer, sem querer, com aquele texto incrível, foi a gota d'água para eu abraçar a ideia de uma vez por todas. Ele associou essa visão que minha amiga tem dos gays tidos como normais pela sociedade com a inserção dos gays na sociedade de consumo.

Eu vejo a sociedade de consumo como uma droga. Nós temos consciencia de que aquilo tudo só faz mal pra todos nós, mas não conseguimos nos desvencilhar dessa realidade. E o pior é que ver uma solução para acabar com isso é um tarefa muito difíciu, tanto que eu não consigo imaginar o mundo agora, de repente, livre do capitalismo selvagem. Eu não quero fazer mais associações aqui, senão esse post não acaba nunca, e eu confesso que já estou muito tempo sem ler nada sobre o assunto, estou enferrujado. Só estou escrevendo com um coração que nunca se conformou com a realidade com que viveu desde que nasceu. Me sinto culpado, por sustentar esse sistema que destroi sonhos, vidas inocentes, ao passo que me sinto injustiçado, por também ser vítima desse sistema, apesar de as ilusões funcionarem como uma espécie de ópio que nos mantém comprando, porque é só pra isso que agente serve, né?

Juntar todo esse, digamos, ressentimento (utilizando um eufemismo muito grande) que eu tenho pelo sistema, com todo o preconceito encrustado nessa sociedade tosca que pode inclusive limitar o meu direito de livre expressão de afeto, ou pior, o meu direito natural de ser Pai (meu sonho é ser pai, e eu quero criar meu filho do lado do meu homem, com todos os direitos que temos e ainda não temos) me pareceu no mínimo chocante. Foi como se alguém chegasse em mim, durante um sono pesado, me sacudisse pelos ombros com força e dissesse:

Qual é, seu idiota... Vai ficar aí parado sem fazer nada? Vai continuar concordando com esse povo só para não ficar mal na fita na frente dos seus amigos?

Eu to perdido. Eu quero fazer, mas não sei o que fazer. Tenho medo, mas também tenho vontade de chocar, de gritar, de discutir, de me impor. O que eu faço agora? Como eu faço? Com quem eu faço? Quem vai lutar comigo? Quem vai me beijar na entrada do cinema só para chocar os pais de familia e as donas de casa de bem? Eu quero tudo isso... Eu não quero ser normal, não quero ser o gay normal... Eu quero entrar na luta, quero sair da casca, sem deixar de ser eu mesmo. Como eu faço???

Eu sonho com o dia em que comentários como o da minha amiga não serão mais ditos. Que nós possamos ser vistos com o mínimo de respeito que merecemos, ou melhor, que não sejamos mais vistos. Que eu poderei chegar no cinema, com um namorado, e beija-lo como qualquer casal tido como normal faz. Eu não quero ser normal, eu só quero ser eu mesmo, plenamente, e que os normais deixem de existir.

Bom gente, isso é tudo que eu tenho a dizer. Nunca pensei que um comentário pudesse dar vazão a tanta coisa que estava entupindo minhas ideias. O fato é que eu estou mais leve do que nunca, mais gay do que nunca (adoro isso).

Um Beijo a todos, de graça... Porque o amor não se compra! Até o próximo post!!!

7 comentários:

Ro Fers disse...

Gostei desse seu post, algumas formas que tu pensava, se parecia com a forma que eu também pensava...
Cada um vive como quer, embora, alguns deixam aflorecer o lado feminino interno, demonstrando delicadeza que as vezes vai surgindo de uma maneira natural, espontânea.
As vezes o garoto nem percebe que é afeminado, sei lá, como funciona o lado internos das pessoas.
Mas ja passei por situações idem a que tu relatou , entre tu e tua "miga fofinha"...mas quanto ao garoto que ele se refere, pena que ele está namorando, melhor tu partir para outro...
Abçs

Anônimo disse...

A pergunta será: É normal ser normal? Sério, nesse mundo com 6 bilhões de pessoas completamente diferentes umas das outras?
Eu também mudei muito minha mentalidade, hoje sou fã dos afeminados e queria conhecer um travesti.
Percebo que algumas vezes, meu fantasma enrustido do passado ainda me faz ficar constrangido ao chegar em ambientes onde vejo gays se pegando (aconteceu no shopping outro dia) mas luto prontamente contra isso. Aos poucos a pressão heteronormativa da sociedade está se esvaindo de meu ser, tanto quanto as outras inúmeras pressões que eles conseguem nos submeter.
Gays são cidadãos mais livres justamente por viverem enclausurados.
Abraços!

Unknown disse...

Desabafo supimpa, Van, me reconheço nas suas palavras e nas do wonderfulcause aqui em cima! Acho que não precisa chutar o balde de uma vez, comece por esclarecer seus amigos que vierem com esse tipo de conversa. E deixe o resto acontecer naturalmente. Ou não! marchagay.blogspot.com :-)

Beijos e boas festas!

Luciana Nepomuceno disse...

Vou me repetir: acho linda a forma como você se descobre e se apresenta concomitantemente. Acho corajosa a forma como consegues dizer o pensamento sem subterfúgios e sem fugir para o fácil e banal. Quanto ao conteúdo em si, acho que a idade (porque proporciona experiências, inquietações, situações) faz um bem danado em relação à tolerância. A mim, fez. Já faz um tempo (muito tempo mesmo, rsrsr) que eu percebi que meunegócio é gente: gosto de gente. E gente é sempre diversa, isso de padrão e normal não me representa nem satisfaz. Ai, é um assunto que rende muito...Beijos, meu querido.

FOXX disse...

gente
eu tow tão orgulhoso de vc agora!
de verdade
orgulhoso de mim tb, não vou mentir
por ter te proporcionado algumas reflexões
mas mais orgulhoso ainda de vc
por vc ter mudado e amadurecido

esse seu post fez os meus seis anos de blog valerem a pena...

Lobo disse...

Hoje em dia eu retalio sem pensar quem me vem com comentários que nem os da amiga fofinha. Antes eu apenas dava aquele sorriso de canto de rosto e ficava quieto. Mas ficar quieto nessas horas é contribuir para a propagação de uma visão preconceituosa da parte destes, e se a gente não se manifestar eles nunca vão se dar conta disso, achando que isso é alguma espécie de elogio.

Um beijo Júlio!

Daniel Braga disse...

Ui. Mais leve mais gay, seria alguma relação entre isso? HAHAH. Enfim, um feliz natal e um ótimo ano novo pra ti.

~Até a próxima.

*DB*